O blog que o Papa lia

quarta-feira, maio 31, 2006

"Globalização Infantil"... ou como idiotas escrevem em jornais.

José Júdice é um homem cuja fotografia aparece todas as semanas no jornal Metro, na capa, a anunciar a sua coluna de opinião. Júdice comete poucos erros gramaticais e de sintaxe, o que é de louvar. Infelizmente a semantica dos seus textos necessita de algum trabalho.

Ora vejamos, no artigo de hoje o senhor de óculos e com um aspecto jornalístico começa com um sensacional:
"A Zara anunciou ter aberto um inquérito para apurar se é verdade que um dos seus fornecedores portugueses de sapatos utiliza mão-de-obra infantil, como foi denunciado no passado sábado pelo 'Expresso'".
Pois bem é este o tema. Ele continua:
"[...] mostrava duas crianças [...] que recebiam 40 cêntimos por dia por cada par de sapatos [...]. Segundo o jornal, conseguiam despachar entre 100 a 160 pares por dia. A ser verdade, cada criança conseguia um rendimento mínimo de 40 euros por dia, o que nao é mau para um miúdo de onze anos cuja alternativa possível seria passar o dia na escola a não aprender nada"
Pois bem, interrompo aqui a citação porque já me estava a aborrecer escrever tanta barbaridade junta. 40 euros por dia é um óptimo rendimento, claro, mas vejamos, o rapaz tem 11 anos... não deveria estar a aprender a ler e a fazer contas para que, quando tiver 60 anos não continue a "despachar" sapatos ? Francamente, o problema maior nem está no facto de Júdice dizer estes factos como positivos e até louváveis mas sim no "na escola a não aprender nada". Neste ponto custa-me não lhe chamar nomes. O homem então está a dizer que todas as escolas deste país são inúteis e que na verdade, seria melhor um "miúdo de onze anos" estar a ganhar 40 Euros por dia do que estar na escola. A falta de consciência começa a tornar-se atrós. Mas, infelizmente, continua...
"[nao aprender nada na escola] ou, talvez, a agredir física e verbalmente as professoras [...] mas esse pormenor parece ter passado despercebido à nossa boa consciência que condena o trabalho infantil."
A dificuldade em não chamar nomes ao mentecapto continua a ser grande. O Júdice agora ainda diz que o rapaz iria agredir as professoras? Os casos de agressão são graves, mas a culpa não é da sociedade! A culpa não é por "não explicarem"! O rapaz de onze anos que é explorado diariamente não vai ser obrigatoriamente um delinquente! A falácia constante nos argumentos do Júdice é algo a que nos temos de habituar. Infelizmente isto é publicado e, graças a haver crianças a trabalhar quando deviam estar na escola, deve haver pessoas a aceitarem todos os argumentos alegremente. Em frente.
"Como, de resto, também ninguém parece ter feito a relação óbvia entre este método de fabrico e a questionável qualidade de muitos dos produtos vendidos na Zara, que ao fim de uma época vão para o lixo"
Atrocidade!! Expliquem-me o que é que a Zara tem a ver com o assunto? A Zara, que inclusivamente está a tomar as acções correctas para evitar que tal aconteça, agora torna-se na má da fita? E o modelo de negócio da Zara também deve ser mau, para julgar as vendas que tem. Será que o Júdice ainda vive em 1945? As pessoas agora querem comprar mto e barato e não umas calças e duas camisas para durar dez anos. Adiante e resumindo o próximo parágrafo.
"O trabalho infantil [...] é um dos tabus da sociedade moderna [...] na sua condenação estão todos de acordo. Os sindicatos porque os miúdos [...] são uma ameaça aos postos de trabalho, os empresários honestos [...] [por causa da] concorrência desleal [...], os moralistas porque a ideia de uma criança forçada a trocar a inocência dos seus verdes anos pelo suor esquálido de um trabalho quase escravo lhes é repugnante, e [...] todas as pessoas [...] se sentem ofendidas e chocadas. As crianças [...] são um bem precioso a defender. E há também aqueles que [...]repetem incessantemente que o que Portugal precisa [...] é de educação. Sem grande sucesso, diga-se."
É um tabu, será que o Júdice quer mesmo dizer isso? Estará a querer dizer que o ser condenável o trabalho infantil é uma questão de mentalidades (esta, uma das suas palavras favoritas, odiosa...)? É triste.
Gosto da parte em que ele fala sobre os moralistas quando ele próprio o é. Isto adicionado a ser um reaccionário maldicente, daqueles que dizem mal só por dizer, do pior que o mundo tem. Quando ele diz que as crianças são um bem precioso, quase que o vejo a rir-se ironicamente. Continua o tom obviamente irónico quando fala de quem diz que Portugal necessita de educação, é triste e, no final, o "deita abaixo" habitual. "Sem grande sucesso, diga-se". E é isto que se escreve nos nossos jornais. Andemos.
"[...] famílias são obrigadas a aceitar esse trabalho semi-escravo que são as empreitadas domésticas para 'industriais' sem escrúpulos. Mas qual a alternativa que têm para comer? Os empregos perdidos não foram substituídos. [...] não serve de consolo que há gente mais miserável do que eles [...]. Como não serve de consolo pensar que os sapatos que eram cosidos no Vale do Ave a 40 cêntimos o par vão passar muito provavelmente a ser cosidos na China a cinco cêntimos o par."
Assim termina o artigo. Finalmente. Empregos perdidos não substituídos. Aparentemente não têm falta de emprego, o que têm é emprego a mais para até os filhos estarem a trabalhar! Se os filhos ganham tão bem, como Júdice já referiu, então por que razão os pais não haverão de ganhar, pelo menos, o mesmo? Falácias, falácias. Ó Zé, tens de começar a ler os teus artigos pá. Aprecio claro o saudosismo dos grandes industriais do Vale do Ave (que poluiram o rio ao ponto de já não haver peixes, mas isso não interessa nada) e, claro, no final, vai tudo para a China, porque os chineses que usam e abusam de trabalho escravo é que são os inteligentes. Gostava era que o Júdice também fosse para a China coser sapatos e até pagava pessoalmente os 5 cêntimos por par!

O preocupante nisto não é o Zézinho ter esta opinião, coitado, não tem inteligência para mais, mas sim o facto de esta ser publicada para pessoas que poderão ser influenciadas. E depois ouve-se nos cafés de esquina que a culpa é dos chineses e que deviam mandar os pretos para a terra deles e que deviam meter os putos todos a trabalhar. Porque se para mim é cómico e diverte-me semanalmente, para muitos acredito que não o seja.